segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Abre os olhos

Giro o mundo dos downloads. É divertido chegar a casa com as últimas novidades. Estar selectivamente contactável a qualquer hora pode tornar-se viciante. Tudo mais rápido, tudo mais variado, mas tudo bem mais perecível. Tudo desaparece rápido no mundo dos downloads, é a vida 2.0 onde se perdeu o tempo para saborear os Momentos. 

Não há como o negar. Seja um prego numa pastelaria para os lados de Algés, um passeio pela Fundação Champalimaud ou uma visita a um cantinho especial em Lisboa, é bem longe do mundo 2.0 que os momentos se agarram. Nem tem de ser um miradouro na Graça ou o Jardim da Estrela, pode ser uma tosta numa esplanada povoada por irritantes mosquitos ou à beira de uma estrada na Costa da Caparica. A experiência diz-me que é a companhia que faz o momento. No mundo dos downloads os discos não se compram olhos nos olhos. No mundo a 2.0 a banda é sacada, no meu a escolha dos discos diz tudo.

Será roqueira? Fã de Chico? Se gostar de Jazz é de pedir o número de telefone. E se for mulher de ainda dar um pulo à música sinfónica, o melhor é casar logo na bilheteira da FNAC. Pararam para ouvir o mesmo disco? Fnac, Chiado, sete da tarde num mundo pré-falência, haverá momento mais caótico na vida de um alfacinha? Mas e se um dia, decidirem parar? Mesmo que até já tenham o disco no mp3 ou que o saldo recomende tudo menos uma edição em Vinil do Abbey Road?

Há quem deixe escapar os momentos. É preciso andar de olhos bem abertos e é sempre mais fácil ignorar que correr atrás. Sem risco e com a garantia da repetição, é tentador seguir a rota tradicional, mas desfazem-se as hipóteses de começar a noite a lanchar no Kafeehaus. De iPod desligado e numa loja de discos? Abre os olhos.. 

A selecção até se quer inconsciente, mas a banda sonora é biográfica e se for boa, a história de quem namora as capas também o será. 

Não conheço reaccionárias que gostem do Zeca Afonso, nem saloias que soletrem todas as letras do Chico. É garantido que nenhuma urbana gosta de reagge e que não há stressadinha com paciência para os Radiohead. Conhecem alguma preconceituosa  que goste de Hip Hop? Ciência não é - poucas coisas o são - mas a escolha da banda sonora é feita de marcas. Tanto serve de aviso como de isco.

Seja por ter companhia, um disco dos Europe lá pelo meio ou por estar demasiada gente à volta, quem nunca desperdiçou um momento? Quem não esqueceu a maioria deles? Os que ficam, tenham sido em esplanadas ou a na Praia Grande a comer Perceves, deixam marca. E essa fica gravada na banda sonora. Um fim de tarde na Fnac será sempre melhor que um passeio pelas melhores sugestões do iTunes e garantidamente que não há aplicação capaz de substituir a honestidade de um olhar. Esses deixam adivinhar a banda sonora. Esses merecem todas as corridas. Esses fazem os grande momentos.



Enjoy